Alguns encontros são inusitados. Divinos.
O vôo 3086 de 20 de Abril de 2011 será lembrado por muitos motivos. Depois de fazer o trajeto Rio-Vitória por duas vezes e na segunda vez com duas arremetidas consecutivas sem concluir a aterrissagem por falta de contato visual, o comandante soberanamente resolveu retornar em definitivo ao Santos Dumont para desespero da galera. A fórmula: véspera de feriadão, cansaço, fome, despreparo e desrespeito da companhia aérea foi explosivo, quase trágico. Uma turba de passageiros quase invadiu o estande da TAM ante a falta de alternativas para passarmos a páscoa em casa. Depois de muito bate boca nada amistoso, a promessa de um vôo às 5 horas da manhã no dia seguinte, um vale-refeição e o translado para o Galeão, acalmaram um pouco os ânimos. O que seria um vôo rápido de 45 minutos se transformou num tremendo PI (programa de índio) de mais de 12 horas. Por conta disso fiquei 26 horas acordado.
Às 2 horas da manhã eu saía do restaurante para encarar o trajeto do terminal 1 para o terminal 2 no Galeão. Quase uma viagem. Por sorte oferecem esteiras rolantes e um carrinho elétrico que ajudam no traslado. Por azar nenhum dos dois funcionava depois da meia noite. Foi aí que encontrei uma senhorinha meio desorientada procurando ajuda. Minutos antes tinha se acidentado no próprio aeroporto e com vergonha me confidenciou que tentou subir a escada rolante com carrinho e tudo. Carrinho e tudo viraram sobre ela causando pânico e sangramentos nas duas pernas. Sozinha, sem ninguém da tal desrespeitosa companhia aérea por perto e com muita bagagem, a senhorinha estava com uma expressão de medo. Aproximei-me tentando confortá-la. Depois de oferecer um café me candidatei a levá-la até o distante terminal 2 numa cadeira de rodas que ofereceram depois da queda. Ela timidamente aceitou. Uns amigos ajudaram levando a minha bagagem. O trajeto foi suficiente para conhecer um pouquinho da história da Edelwiss. Viúva, sem filhos e morando sozinha, estava indo até sua terra para rever parentes. Nascida em Afonso Cláudio, depois de casar mudo-se para Niterói onde aposentou-se como funcionária pública. Acompanhei a Edelwiss até a sala de embarque e ela constantemente agradecia dizendo que não sabia o que seria da vida dela sem esta ajuda. Nem tanto.
A apoteose deste encontro ainda estava por vir. Às 4 da manhã ela se aproximou e num longo e emocionante discurso, declarava seu amor por Jesus, tentando me evangelizar. Suas palavras aqueciam meu coração e eu me convertia a cada afirmação. Deus nos ama, mas odeia o pecado. Todos somos pecadores. Deus amou o mundo a ponto de enviar seu único filho. Quem tem Jesus tem a vida eterna. E de muitas maneiras entregava a Palavra sistematizando o plano de salvação de várias formas, todas apaixonantes. Eu só me deliciava e quase uma hora depois me revelei de vez quando completei alguns versículos, que ela falava de cor com fartura, e não resisti e cantei com a Dona Edelwiss o coro de um hino. Ela a plenos pulmões, eu um tanto acanhado por conta do silêncio que todos faziam naquele saguão. Ela foi a resposta de minhas orações. Tenho pedido a Deus o dom de evangelista. Ele me revelou o dom encarnado numa serva que corajosamente não perdeu tempo em influenciar um desconhecido que atravessou seu caminho. Descobri então que ela estava indo para Vila Velha não para curtir o feriadão, mas para participar de um projeto missionário: a Tenda da Esperança. Minha vergonha só aumentava. Trocamos telefones. Quero tomar outro café com Dona Edelwiss e pedir para que ela ore com imposição de mãos sobre Isabella, Monique e Ana Paula. Quem sabe, por misericórdia, minhas filhas recebam o dom de evangelista assim como a irmã Edelwiss?
Já no aeroporto de Vitória, ela ainda me fez um último pedido. Ore por mim. Pra que a Senhora se reestabeleça da queda? Não, para que meu projeto missionário tenha sucesso e vidas sejam transformadas. Seu projeto já começou, irmã Edelwiss, minha vida foi transformada.