sexta-feira, 23 de novembro de 2012

a empresa e seu legado




Em 2009 uma jornalista me entrevistava e olhando nos meus olhos perguntou? Qual é o projeto social de sua empresa? O que vocês têm feito nesta área? Enrolei, gaguejei, virei o olho tentando buscar na memória algo que parecesse ser uma resposta bem inteligente e disse que fazíamos muitas ações, mas nada tão estruturado que pudesse ser apresentado num bonito relatório social. Nós não tínhamos uma fundação ou algo parecido que gerenciasse tais ações. De fato a empresa sempre fora muito sensível e atuante em programas de auxílio social, mas nada formalizado. Disse também que achava muito importante enfiar a mão no bolso e investir em programas e ações sociais, mas que tão importante quanto isso seria a empresa levantar a bandeira de uma idéia, um propósito, um valor, uma causa. Então confidenciei um sonho: eu gostaria de influenciar as famílias a se reunirem em torno da mesa.

De lá pra cá temos trabalhado incansavelmente na promoção deste valor. Nossa proposta de comunicação institucional tem como centralidade a família em torno da mesa. Pesquisas revelam que as famílias vivem de forma mais equilibrada quando investem neste esquecido hábito de se sentarem em torno da mesa para suas refeições. Os adultos ficam mais equilibrados, as crianças no futuro não se envolvem com drogas ou álcool. Tiram as melhores notas da escola, ficam mais sociáveis e seguras. Quer maior legado que este? Queremos promover uma geração sarada física e emocionalmente.
Toda grande empresa tem grandes propósitos, grandes causas. Penso que o papel do varejo é servir, é acreditar em seus valores e ajudar seus clientes a adotá-los

Recentemente promovemos um concurso cultural e os clientes tinham que responder à seguinte pergunta: Por que reunir a família em volta da mesa faz bem? Aprendi de um papa da comunicação que se seu cliente escreve algo de bom sobre sua empresa ou sobre os valores que você acredita, passa a se comprometer com a proposta. Escolhemos criteriosamente as melhores frases, fretamos um avião e levamos os criativos ganhadores e suas famílias para um passeio inesquecível num resort. Este é o nosso legado: que as famílias se reúnam à mesa num encontro saudável e legal.
Qual é seu propósito? Ganhar dinheiro? Qual sua causa? Abrir lojas? Qual seu valor, seu legado? Desafio a você varejista a abraçar causas mais nobres. A próxima geração merece seu esforço, sua criatividade, seu empenho.
Boas vendas, boas causas e mãos à mesa.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

a volta do filho pródigo - o livro





Quando a expressão artística funde-se com o conhecimento da Verdade, surge o belo.  A arte nada mais é do que uma fagulha da divindade expressa de uma forma perceptível. A poesia, a melodia, a métrica, a estética, a harmonia, enfim, o belo pertence a Deus. Eventualmente damos um salto e alcançamos esta dimensão.
Não me lembro de ter lido o mesmo livro mais de uma vez. Mas li quatro vezes A Volta do Filho Pródigo de Henri Nouwen. O melhor. O autor, um padre holandês, conseguiu entrar nesta dimensão do belo, numa amálgama perfeita que confundimos sua experiência com a Palavra revelada. E é assim que A Volta se desenrola. Uma profusão de vivências do autor em comparação com a história bíblica. Vida com Deus sugere compararmos os acontecimentos com as Escrituras. A receita desta amálgama passa por uma pintura do século XVII, uma parábola do século I e um homem do século XX em busca do sentido da vida.

o encontro

Um encontro displicente com um poster mudou a história de Henri. A gravura, uma réplica da pintura A volta do filho pródigo de Rembrandt, encantou o autor. Uma viagem inusitada a São Petersburgo, na Rússia foi a chance para visitar o Museu Hermitage, onde por horas se inebriou com a beleza da pintura original de Rembrandt . Depois de realizar muitas anotações e ouvir atentamente os comentários dos guias e visitantes sobre a pintura, Henri decidiu relatar suas descobertas. Foi a faísca necessária para que uma explosão de comparações entre os detalhes da pintura e as nuances da parábola se harmonizassem.
Deus ama encontros, se manifesta através deles e conduz a história por eles. Quer com pessoas ou objetos, encontros são sempre significativos. Henri Nouwen entendeu este princípio e escreveu A Volta do Filho Pródigo.

a identificação

Um dos pontos centrais do enredo de A Volta é a identificação do autor com os personagens. Ora o filho mais moço, ora o filho mais velho, ora o pai, com hábil capacidade argumentativa e refinado olhar para as demandas humanas, somos conduzidos pelas semelhanças de cada um desses protagonistas, suas características e seus arquétipos. Tais características são apresentadas de tal maneira que o leitor é, irresistivelmente, levado a se identificar com os personagens também.

o filho mais moço

Levante a mão quem se percebeu a “vida toda procurando amigos... carente de afeição... interessado em milhares de coisas, solicitando de um lado e de outro, atenção, louvor e afirmação.” Assim é o filho mais moço que sai da casa do pai dando ouvido a vozes instigantes que dizem : “Vá e mostre que você vale alguma coisa”. Com pensamentos que  sugerem que “não serei amado se não conseguir por meio de trabalho árduo e muito esforço” a aprovação que tanto anseio. Partimos para uma terra distante todas as vezes que sentimentos como “raiva, ressentimento, ciúme, desejo de vingança, luxúria, ganância, antagonismos e rivalidades” povoam nosso ser.
No quadro de Rembrandt o filho volta descalço e com a cabeça raspada, um indício de escravidão, mas o pai o recebe afetuosamente, com uma inclinação corporal significativa, com mãos protetoras e amáveis que vendem segurança.  Mãos da paternidade sem gênero, holística: a direita tipicamente feminina e a esquerda masculina.  O masculino e o feminino em ação. Uma tentativa de demonstrar iconograficamente o amor pleno.

o filho mais velho

O mais velho estava no campo. E é no campo que nos sentimos amargurados, indignados com a vida quando o irmão “diferente” é paparicado. É na árdua lida do campo que nos sentimos desprestigiados e sem reconhecimento. Este tipo representa quando nos revoltamos e percebemos que fizemos tudo na vida de forma correta, que atendemos religiosamente as figuras paternas – pais, responsáveis, autoridades, professores, patrões – e mesmo assim não somos recompensados ou reconhecidos. Uma injustiça para os mais polidos. E cheios de justiça própria, perdemos o traquejo e travamos. Ressentidos, não dançamos nem participamos da alegria da mesa do pai. Que chato. Somos mais velhos quando cedemos à métrica do mundo que compara, que mede, que insiste em estatísticas. Perdemos tempo e energia quando nos comparamos com os outros irmãos.
Na parábola o filho mais velho não está presente nem se alegra com a volta do perdido. Ele teria algo mais importante pra fazer. Mas Rembrandt não se prende a letra e retrata os dois irmãos na mesma obra. O mais velho, de pé à direita, coberto com um manto vermelho como o pai, é um espectador distante, que “olha para o pai mas sem alegria...não se aproxima, não sorri, nem expressa boas vindas”. Neste cenário teríamos um ótimo enredo para que Rembrandt pintasse outro quadro: A volta do filho mais velho.

o pai

Somos pródigos quando nos encontramos em terras distantes, onde a língua, os costumes e valores em nada se parecem com a casa do pai. Também somos filho mais velho quando não desfrutamos da plenitude da alegria da mesa do pai. Mas o target de nossa caminhada deve ser assumirmos o papel de pai: que espera, concilia e ama, por isso sofre. Que se alegra quando um filho retorna. “Alegria que não será completa até que todos aqueles que dela tenham nascido tenham regressado a casa e se reunido ao redor da mesa preparada para eles”.  Pai é aquele que sai ao encontro de todos os filhos, sem distinção. Sai para trazê-los para a mesa. Quando assumimos o ministério da paternidade abrimos mão de nossos direitos e investimos no outro com o propósito de levá-lo para uma festa badalada. Mas será que “desejo ser como o Pai? Será que desejo ser não somente aquele que está sendo perdoado, mas também aquele que perdoa? Não somente aquele que é bem vindo, mas aquele que acolhe? Não unicamente aquele que é tratado com compaixão, mas aquele que tem compaixão?” Queremos investir na carreira de promoters?
Na pintura a apoteose se revela nas mãos do pai. É o ápice da luz. Onde nosso olhar se detém. Mãos poderosas e carinhosas ao mesmo tempo. Mãos quentes, que acolhem e chamam para si. Que apertam contra o peito pulsante de tanta alegria. Que não tem medo do toque. Numa era high tech o que mais precisamos é de high touch.